top of page

Willy Noir está realizando o seu sonho de levar o AfroHouse e o Kuduro ao redor do mundo



.A ascensão meteórica das danças e músicas urbanas africanas em Nova Iorque ganhou forma entre 2017 e 2018. Lembro-me do meu feed do Instagram e do YouTube estar cheio de dançarinos do continente e da Europa dançando ao som dos ritmos contagiantes que vinham de África. Um dos dançarinos que aparecia regularmente na minha tela era Willy Noir. Naqueles primeiros anos, Willy foi fundamental para manter o AfroHouse e o Kuduro angolanos dentro da conversa sobre música e dança urbanas africanas.


Em 2019, participei da minha primeira aula com Willy Noir em Nova Iorque, organizada por Jlynn através da sua plataforma AfrodanceNYC, que oferecia aos artistas visitantes a oportunidade de partilhar o seu trabalho na cidade. Depois daquela primeira aula, fiquei viciado. A energia de Willy, o footwork veloz e a sua positividade eram contagiantes — e desde então tenho acompanhado a sua carreira.


Ao longo dos anos, Willy cruzou o mundo, levando AfroHouse e Kuduro angolanos a novos públicos. Ele viajou por toda a Europa, Américas do Norte e do Sul, África — e em 2024 acrescentou a Ásia e a Austrália à lista de continentes onde deu workshops. Willy também lançou o AfroDrip Dance Camp, realizado duas vezes por ano em Amesterdão e hoje parte da crescente lista de campos de dança europeus centrados nas danças urbanas africanas. Em 2024, expandiu o conceito para a Ásia com o AfroJam Dance Camp na Tailândia. Conversei com Willy para saber mais sobre o homem por trás da dança e o seu movimento mundial.


AFROCONEX: Willy, obrigado por dedicar este tempo a falar comigo. Tenho acompanhado o teu trabalho ao longo dos anos e vi o teu compromisso firme com a tua arte. Muitas pessoas te conhecem como o dançarino de AfroHouse com o grande cabelo, mas vamos aproveitar esta oportunidade para que te apresentes e partilhes um pouco sobre quem é Willy Noir.


WILLY NOIR: Obrigado por me receber. Willy Noir é o meu nome artístico e sou de Amesterdão, nos Países Baixos, com raízes brasileiras. Os meus pais são afro-brasileiros e cresci rodeado pela cultura afro-brasileira — os tambores, a música de pagode, o axé e o samba. A minha primeira exposição à música e à dança foi através da cultura brasileira. A minha mãe era sambista, dançou em carnavais nos anos 80 e 90. Ela foi uma grande inspiração para mim e devo-lhe a introdução ao tambor e a artistas como Olodum, de Salvador da Bahia. Ela ouvia música brasileira o tempo todo quando eu era criança. Na altura, isso me incomodava, mas hoje percebo o quanto isso me influenciou. O meu pai era guitarrista e foi ele quem me apresentou à soul music. Então, a minha infância foi realmente uma mistura de música afro-brasileira e R&B.


Quando tinha cerca de 10 anos, comecei a dançar. A minha maior inspiração era Michael Jackson. Eu assistia sempre aos seus vídeos — Beat It, Thriller — e copiava os seus movimentos. Por volta dos 12 anos, comecei a aprender House e Hip Hop. Nos meus primeiros anos de adolescência, mergulhei profundamente nesses estilos. Mais tarde, por volta de 2002, um amigo angolano, Manutelo, apresentou-me o Kuduro. A partir desse momento comecei a pesquisar a música e a dança, e apaixonei-me completamente. Comecei pelo Kuduro e mais tarde transitei para o AfroHouse.


Por volta de 2012/2013 conheci Blaya, do Buraka Som Sistema. Ela foi uma enorme inspiração para mim e para a minha transição para o AfroHouse. Estava sempre a publicar vídeos a dançar e, na altura, também viajava pelo mundo atuando com o Buraka. Lembro-me de pensar: um dia quero fazer isso — viajar pelo mundo e ensinar dança. Mais tarde, quando Blaya veio aos Países Baixos, tive a oportunidade de a reencontrar. Treinámos juntos e trocámos movimentos de AfroHouse. Em 2014 comecei a ensinar AfroHouse e Kuduro, com a intenção de partilhar o meu conhecimento sobre a dança.



AFROCONEX: A minha primeira aula contigo foi em 2019 em Nova Iorque — uma aula de AfroHouse através da plataforma AfrodanceNYC de Jlynn. O impressionante é que, desde então, mantiveste o teu compromisso com o AfroHouse e, hoje, posso dizer com segurança que és um dos dançarinos e professores de AfroHouse mais viajados, levando a dança a vários continentes. O que é que te conecta tão profundamente ao AfroHouse? E porque escolheste permanecer fiel a ele, em vez de mudar para outros estilos por causa das tendências?


WILLY NOIR: Por volta de 2002/2003 foi a primeira vez que ouvi Kuduro — a música era Dança de Chiriri de Magnesia. Quando ouvi, senti uma energia enorme, e foi aí que percebi que o Kuduro me dava vida. Há algo na minha mente que se transforma sempre que ouço Kuduro e AfroHouse. É por isso que me mantenho fiel ao AfroHouse — ele representa as minhas experiências, a minha educação, o meu treino e as minhas origens.


Também faz parte da minha marca. Eu apresento-me como artista de AfroHouse, e serei sempre um artista de AfroHouse. É quem eu sou, e não vou mudar apenas por causa de uma tendência ou do que estiver na moda. AfroHouse é quem eu sou, e AfroHouse sou eu.



AFROCONEX: Como é que a tua herança afro-brasileira te ajudou a conectar-te com a cultura angolana?


WILLY NOIR: Como mencionei antes, cresci dentro da cultura afro-brasileira. Então, quando vejo a ginga — o balanço — na cultura e na dança angolana, isso lembra-me a ginga no samba. A capoeira brasileira também tem raízes em Angola. E claro, Brasil e Angola estão ligados pela escravidão e tudo o que ela trouxe. Então sim, existem muitas conexões e semelhanças entre a cultura brasileira e a angolana.



AFROCONEX: A tua capacidade de levar o AfroHouse a diferentes países e continentes ao longo dos anos mostra que há uma procura real pela dança. Que mudanças notaste na forma como o AfroHouse é feito, recebido e nos tipos de plataformas e espaços onde agora existe? E olhando para o futuro, como vês o AfroHouse, o Kuduro e as danças afro em geral?


WILLY NOIR: Uau, essa é uma ótima pergunta. Vi o AfroHouse mudar muito. Há dez anos, a dança era composta sobretudo por passos simples, e quase não havia pessoas a ensinar. Hoje, com as redes sociais, TikTok e tudo isso, o AfroHouse evoluiu muito — tanto para o bem como para o mal. Vejo muitas influências no estilo: Pantsula, Ndombolo e outros sabores. Acho isso positivo porque a dança tem sempre que evoluir. O Hip Hop de há 20 anos não é o mesmo de hoje. O AfroHouse de há 10–13 anos era sobretudo um ou dois passos, passos de festa. Hoje vejo mais combinações, mais experimentação com diferentes estilos. Para mim, continua a ser AfroHouse, porque vejo o AfroHouse como um estilo legítimo que cresce e evolui.


A música também mudou. Hoje temos muitos novos produtores, bem diferentes de há 5–6 anos. Existem produtores angolanos e portugueses como Vany Vox e Billy G, que criam um tipo de AfroHouse diferente do que tínhamos há 10 anos, com sons como Matimba (HomeBoyz), Vote (DJ Nelasta e DJ Romano) e Leo Beats. O som hoje é mais duro, mais pesado — e a dança acompanha essa evolução.


Algumas das maiores influências que vejo a moldar o AfroHouse hoje, tanto na comunidade como no palco mundial, são Telminho, dos Os Piluka — que influenciou muito a dança. Depois há Septzilla, mais experimental com o footwork e a sua vibração; ele é mais underground, e eu adoro isso. Também temos Marcio Moikano, Braulia, Selma — que tem grande presença na cena e ensina pelo mundo afora. Vandro Poster e Manuel Kanza representam a velha escola, espalhando conhecimento globalmente, o que é fundamental. Então sim, a dança tornou-se mais experimental, mas isso é bom — a dança tem que mudar.


Quanto ao futuro do AfroHouse, vejo-o muito brilhante — mas todos precisamos trabalhar juntos. Nós, como dançarinos, estamos indiretamente conectados aos produtores e artistas. Se os produtores pararem de criar, não haverá novas danças, porque não podemos dançar apenas música antiga. Se os produtores de AfroHouse em Angola, Portugal e no mundo continuarem inspirados a criar, os dançarinos também continuarão a criar, e os músicos também. É um ciclo. E claro, temos o ecossistema dos eventos — os festivais, que eu próprio organizo. Se o AfroHouse continuar presente nos festivais, a cultura vai continuar viva. Se algum desses fatores falhar, a dança será desafiada. Mas, neste momento, acredito que o futuro do AfroHouse é muito brilhante.


AFROCONEX: Quais foram alguns dos momentos mais memoráveis para ti como dançarino e professor ao longo dos anos? E que conselhos darias a dançarinos que queiram seguir os teus passos?


WILLY NOIR: Os meus momentos mais memoráveis como dançarino ou professor…hmmm…mano, um dos maiores é ver dançarinos de todo o mundo — China, EUA, Brasil, África do Sul, Índia, Rússia — dançando as minhas músicas. Eu também sou artista e produtor, e cada vídeo que eles me enviam é diferente porque cada um ouve a música de uma forma própria. Isso deixou-me de boca aberta, como “uau, cada pessoa ouve a música de um jeito diferente”. É louco partilhar um pedaço do meu estilo e depois ver as pessoas a abraçarem-no de corpo e alma. Isso dá-me ainda mais vontade de fazer o meu melhor para manter a dança, a cultura, a energia e o amor que tenho pelo AfroHouse vivos. AfroHouse dá-me uma boa sensação — e eu quero passar isso para os outros também.


Um dos conselhos mais importantes que sempre dou aos meus alunos é: viajem. Eu não passei muito tempo a aprender na escola. O meu maior professor foi viajar — encontrar pessoas com a mesma mentalidade, pessoas que queriam as mesmas coisas que eu e que queriam criar. Se eu não criar, fico deprimido. Quem cria precisa dessa motivação para continuar a criar, porque há sempre algo novo para aprender.


Como dançarino e professor, sim, estás a ensinar — mas também estás a aprender. Isso nunca acaba. Mantém-te sempre aberto para aprender coisas novas. Nunca és demasiado velho para aprender — essa é uma das principais mensagens que passo aos meus alunos. E viagem, porque isso vai mudar completamente a tua mente e a tua visão do mundo. Às vezes as pessoas dizem: “Ah, é perigoso, se fores para lá vais morrer.” E depois vais — e acabas por ter o melhor momento da tua vida.



AFROCONEX: Parabéns por criares o teu próprio campo de dança, o AfroDrip. Podes contar-nos mais sobre o campo — o que te levou a criá-lo, e qual é a tua visão e os teus objetivos para ele?


WILLY NOIR: Obrigado, irmão, obrigado. Eu comecei o AfroDrip há uns cinco anos porque queria partilhar a minha dança com mais pessoas. No início era apenas AfroHouse, com artistas locais dos Países Baixos, mas cresceu e tornou-se algo muito maior. Mais tarde abri outro campo, o AfroJam, na Ásia — e está a correr muito bem. Os dançarinos lá são super entusiasmados para aprender.


AFROCONEX: Nas redes sociais, muitas vezes só vemos as histórias de sucesso, mas raramente os desafios por trás delas. Podes partilhar alguns dos obstáculos que enfrentaste ao organizar o AfroDrip e como conseguiste superá-los?


WILLY NOIR: Foi um caminho difícil. Viajar pelo mundo é muito exigente, e organizar um evento como o AfroDrip também exige muito. Quando aparece um problema, resolves — e logo surge outro, e tens de resolver também. É muito trabalho. Sem dormir. Noites em claro. Às vezes enlouqueces e até acabas por discutir com pessoas. Mas acho que isso faz parte da jornada.


Uma das partes mais difíceis é a confiança. Trabalhas com pessoas, e às vezes elas querem as coisas feitas de maneira diferente ou tentam aproveitar-se de ti. Existem muitas dificuldades quando fazes algo por conta própria. Por isso agora eu organizo e faço a gestão sozinho. No passado, trabalhei com outra pessoa, mas foi demasiado complicado, então parei. Gerir sozinho também é desafiante, mas no fim compensa. E para mim, a consistência é fundamental — ajuda sempre.



AFROCONEX: O AfroDrip acontece duas vezes por ano. Há diferenças entre as duas edições? Como é estruturado o campo? E o que queres que os alunos levem dessa experiência?


WILLY NOIR: Sim, o AfroDrip acontece duas vezes por ano em Amesterdão, e o AfroJam também acontece duas vezes por ano em Banguecoque. O lineup é diferente entre os dois campos. Para mim, o mais importante é a autenticidade dos professores. Eu gosto de trabalhar com professores que vêm da cultura ou que estão muito próximos dela.


Normalmente convido colegas e pessoas que conheço da cena da dança — professores que não só sabem ensinar, mas que também podem dar aos alunos algo que eles possam levar consigo por muito tempo. Não é só sobre os passos. É também sobre cultura e sobre partilhar informação sobre a vida como dançarino.



AFROCONEX: Parabéns por expandires o campo para a Ásia! Por que o mercado asiático foi importante para ti? E como o AfroDance foi recebido lá?


WILLY NOIR: Eu viajei pelo mundo e vi que a comunidade de dança na Ásia tem muita fome de aprender. Quando eles se comprometem com algo, dão-se por inteiro — e é esse tipo de energia que eu quero. Essa energia falta um pouco na Europa, mas eu encontrei-a na Ásia, especialmente em lugares como as Filipinas e o Japão. Os dançarinos lá são tão talentosos que eu pensei: uau, o que é que está a acontecer aqui? Então decidi abrir o AfroJam na Ásia, e foi uma decisão muito boa. A receção tem sido incrível.


Acho que os dançarinos asiáticos são muito respeitosos e têm uma ética de trabalho forte, e eu quero que recebam a informação da fonte certa. Porque a verdade é que há pessoas na Ásia que nunca viram uma pessoa negra na vida, e ainda assim estão a ensinar Afro. Como pode alguém que nunca se conectou com a cultura ensinar? Se eu perguntar a alguém “o que é o Hip Hop?” e a pessoa não souber responder, como pode ensinar? Eu vejo muito disso acontecer na Ásia, então quis trazer-lhes a experiência autêntica — para que eles possam ver o que realmente é.



AFROCONEX: O que é que os alunos e fãs podem esperar de ti no futuro? Para aqueles que ficam nervosos em participar no AfroDrip, que conselho darias? E finalmente — quando podemos esperar ver Willy Noir em Angola?


WILLY NOIR: Este ano estou focado nos dois campos e em música nova. Quero afastar-me um pouco do ensino porque não tenho tido muito tempo para mim, nem para continuar a aprender. Estou a planear ir para Angola e África do Sul, provavelmente depois do verão. Também estou a focar-me em música nova e a mergulhar mais no Kizomba e no Semba. Eu adoro esses estilos e sinto-me muito atraído por eles. Então sim — Kizomba e Semba são o meu futuro.


O meu conselho para quem pensa em vir ao campo é simples: venham, calcem os vossos sapatos de dança e aproveitem. Não fiquem nervosos. A comunidade vai receber-vos com amor. Nós não julgamos nem rimos de ninguém — nós dançamos e desfrutamos. É para isso que estamos aqui. O AfroDrip é sobre partilhar aquilo que amamos. É sobre dar e receber através da dança.


Clips dos primeiros anos de Willy Noir:

2016



2018



Willy In Asia:


Phillipines


Japan


Singapore


Vietnam


Thailand


Comentários


  • Facebook
  • Instagram
  • YouTube

©2020 by AfroConex. Proudly created with Wix.com

bottom of page